ATRAVESSANDO O DESERTO DA PERDA 2 - RELACIONAMENTOS

A PERDA DOS RELACIONAMENTOS

"É só na solidão que a alma se revela,
Como uma flor noturna as pétalas abrindo,
A uma luz, que é talvez o clarão duma estrela,
Talvez o olhar de Deus, de astro em astro caindo... "
António Feijó, in Sol de Inverno [1]

Caso 1 - Abandono

Somos um ser relacional, pelo que a perda de relacionamentos pelo abandono e rejeição é terrível, sobretudo quando os que mais amamos se revelam diferentes das expetativas. Um marido que se tornou um estranho, levou à destruturação da família e do ego.
Lisa era nova convertida e recém-casada quando emigrou para o Canadá com o novo marido e a filha adolescente. Em pouco tempo perdeu a saúde, foi abandonada pelo marido que só tinha interesses económicos na relação, e a filha fugiu várias vezes, manipulada por um casal da sua igreja, que conspirou para lhe tirar a menina.
Lisa vinha de uma infância muito isolada e protegida. Por ser tímida e complexada, não estava preparada para a vida e apanhou um choque com o que lhe aconteceu. Regressou, sem nada, à sua terra natal, com uma adolescente revoltada, a qual ao chegar ao Aeroporto de Lisboa rejeitou a mãe e foi viver com o pai biológico.
Passados 11 anos Lisa continua a tentar a reaproximação.

O rompimento das relações entre pais e filhos é algo tão sério que destrutura vidas em todas as culturas. Não foi por acaso que Jesus fez questão de contar a Parábola do Filho Pródigo (Lucas 15) e a Bíblia traz-nos a revelação de Deus, como Pai (Isaías 64:8; Salmos 68:5, Hebreus 12:7-10), um pai muitas vezes desertado e desrespeitado pelo seu povo. Ainda assim Ele continua sempre de mãos estendidas:
“Como um pai se compadece dos seus filhos, assim o Senhor se compadece daqueles que o temem. Pois ele conhece a nossa estrutura; lembra-se de que somos pó.” Salmos 103:13-14 (RC)

Caso 2 - Divórcio

Aos 40 anos Cristina foi largada pelo marido sem qualquer explicação, depois de ter sido exposto em adultério. 14 anos em comum esfumaçaram-se, deixando um rasto de destruição emocional, dúvidas espirituais e dívidas financeiras que a obrigaram a vender praticamente tudo, pois um ano antes tinha ficado desempregada. Passados 5 anos, partilha ainda uma hipoteca que a impede de reconstruir a sua vida dignamente.
Cristina chora, a sós, os dois abortos que teve, mas pondera: como conseguiria educar filhos sozinha com rendimentos abaixo do mínimo?
A sua confiança em Deus foi a única coisa que a impediu de enlouquecer. Ficou sozinha.

Talvez uma das perdas mais incompreendidas, até pela própria pessoa que a experimenta e pelos que a rodeiam, é a perda de uma separação ou divórcio, que deixa o sabor amargo dos inúmeros porquês inexplicáveis e que nem tem sem sequer um ritual de encerramento como um funeral. O luto é confuso e frequentemente mal-acompanhado. As opiniões dividem-se e os divorciados enfrentam o estigma e, muitas vezes, a deserção de familiares e amigos, sem saberem porque o mundo inteiro lhes desabou em cima.
“A rejeição é uma forma de ódio. Quando se escolhe o rompimento de um relacionamento, escolhe-se odiar. Ninguém consegue odiar sem que as trevas escureçam a sua vida. (…) a pessoa amargurada perde a sua perspetiva de vida (…).” [2]
Diz-se que uma mulher rejeitada pode nunca recuperar do sentimento de abandono, e que, na melhor das hipóteses, levará até 5 anos a conseguir algum tipo de normalidade. As cicatrizes provocadas por um divórcio, são profundas e nunca desaparecem: independentemente de existirem ou não filhos e da pessoa voltar ou não a casar. O sentimento de fracasso, na relação mais íntima que um ser humano pode ter com outro, acompanhá-la-á por toda a vida.
O casamento é a única aliança de sangue [3] que temos com outra pessoa, para além de Jesus, e aos olhos de Deus é inquebrável até à morte.
"A Bíblia apresenta claramente o casamento como uma união íntima e permanente entre marido e mulher. Este é o ideal imutável de Deus. Mas, desde o pecado original, os seres humanos estão vivendo num nível abaixo do ideal." [4]
O divórcio equivale a um homicídio, os seus efeitos são duradouros e afetam a família, a igreja e a sociedade. Aqueles que o praticam, contra a parte inocente, cobrem-se de maldição:
"o Senhor foi testemunha de que faltaste à promessa que fizeste à mulher com quem casaste quando eras jovem. Era a tua companheira e prometeste-lhe fidelidade. (…). Portanto, (…) que ninguém falte à promessa que fez à mulher da sua juventude. Pois quem deixa de amar a mulher e a abandona fica coberto de violência. Palavra do Senhor, todo-poderoso, o Deus de Israel! (…)" Malaquias 2:14-16 (BPT)
"O povo de Judá foi infiel a Deus e cometeram-se ações horríveis (…). Desrespeitaram o santuário que o Senhor tanto ama; casaram-se com mulheres que adoram deuses estranhos." Malaquias 2:11 (BPT)
Ainda que o perdão seja o primeiro passo para a libertação da própria pessoa que é ofendida, a perda provocada pela impossibilidade da reconciliação, a vergonha e as consequências para as gerações futuras são esmagadoras e complexas.
“(…) o fim de um casamento pode desagregar completamente a vida, as rotinas, o amor próprio e o senso de segurança. O divórcio pode afetar a pessoa física, psicológica e espiritualmente.” [5]
“Provavelmente, o divórcio é mais traumático do que uma morte na família, já que ele afasta os membros da família, em vez de uni-los. Poucas crises familiares produzem mudanças tão profundas em tantas vidas.” [6]

Como superar a Perda de Relacionamentos?

O único caminho é lidar com estas perdas, e tirar delas o máximo de amadurecimento pessoal.
“O luto pela perda no momento da separação tem de ser elaborado, mesmo sem que haja a morte concreta. Vários desfechos podem ocorrer, desde a consciência da perda e uma reorganização da vida com a retomada das atividades, projetos e investimentos em novas relações.” [7]

No caso de Lisa, Deus colocou-lhe um grupo de oração de mulheres que a auxiliaram a erguer-se de um estado profundo de depressão. A força para viver foi-lhe dada por experiências íntimas com Deus, ao longo de um deserto insuportável. Essas experiências incluíram visões, sonhos e o Batismo no Espírito Santo. Numa das visões, Deus revelou-lhe que a filha se reaproximaria quando estivesse chegando o tempo do fim. Conheceu uma missionária que a levou em trabalho de campo, onde viu milagres extraordinários. Ao longo dos anos, aprendeu a descansar em Deus, a aceitar o seu amor no meio da carência e a contra-atacar as memórias difíceis com a Palavra de Deus. O Senhor ensinou-a a depender Dele em absoluto e a colocá-lo em primeiro lugar acima de tudo e de todos.
O seu conselho para quem passa por perdas semelhantes é que devemos saber qual a nossa identidade em Cristo, estruturamo-nos nas Suas Promessas, pois a Bíblia é um contrato de transformação. A vida cristã deve ser vivida com a máxima seriedade, acreditando que:
“A  é pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus.” Romanos 10:17 (RC)

No caso de Cristina, os exemplos de Kathryn Kuhlman e Teresia Wairimu [8], as quais depois de passarem pelo divórcio ainda foram tremendamente usadas por Deus, inspiraram-na a focar-se no Reino dos Céus. Fez 3 cursos num espaço de 4 anos, incluindo um Bacharel. Foi convidada para dar aulas e coordenar uma Escola Teológica presencial e on-line. Viaja em apoio à plantação e formação de igrejas e escreve reflexões cristãs. Está feliz, realizada e em paz.
O seu conselho é: fazer o melhor com o que resta. A Eternidade foi colocada no coração dos homens (Eclesiastes 3:11): como comparar meras dezenas de anos nesta terra, com bilhões de milhões de milhares de anos, na vida eterna? A volta de Cristo está iminente: as escolhas que fazemos aqui, determinarão galardão no céu, ou punição no inferno, logo, ficar a remoer o passado não adianta para nada. A vida é demasiado curta e preciosa para ser desperdiçada!

[1] http://www.citador.pt/poemas/hino-a-solidao-antonio-feijo, visto a 13-03-17
[2] THOMPSON, Carroll, Feridas satânicas, p. 47
[3] https://dicasdatininha.blogspot.pt/2014/09/casamento-alianca-de-sangue.html
[4] COLLINS, Gary, Aconselhamento cristão, p. 531
[5] Ibid. p. 536
[6] Ibid. p. 537
[7] CATERINA, Marlene de Carvalho. O luto: Perdas e rompimento de vínculos, p.33
[8] BONNKE, Reinhard. Coisas Ainda Maiores

ATRAVESSANDO O DESERTO DA PERDA - RELACIONAMENTOS

Veja também a Parte 1 Parte 3

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